BERNARDO MELLO FRANCO
BRASÍLIA - A luta de classes pode não ser mais o único motor da história, como dizia um filósofo alemão no século 19. Mas voltou a mostrar a cara no Congresso, que prepara um "liberou geral" para a terceirização da mão de obra no país.
O conflito entre capital e trabalho raramente esteve tão às claras. Os empresários, que financiam as campanhas, fazem pressão para aprovar o projeto. Os sindicalistas, com as exceções de praxe, tentam fazer barulho diante da derrota anunciada.
Na terça-feira, as duas tropas receberam tratamentos desiguais na Câmara. O presidente da Fiesp percorreu gabinetes e cochichou nos ouvidos de deputados. Os militantes da CUT ficaram barrados do lado de fora, onde trocaram sopapos com a polícia e inalaram gás lacrimogêneo.
A mudança terá impacto sobre milhões de brasileiros, mas nenhum deles foi autorizado a acompanhar o debate de ontem nas galerias. O presidente Eduardo Cunha recusou apelos para adiar a votação. "Se precisar, ficaremos aqui até as três da manhã", anunciou, em tom imperial. Não precisou: a fatura foi liquidada pouco antes das 21h. A favor do lobby empresarial, é claro.
A terceirização pode elevar a produtividade de alguns setores, mas exercerá forte pressão para reduzir direitos e salários. Os trabalhadores, que já sofrem os efeitos da crise, deverão ser ainda mais sacrificados.
É uma ironia da história que a proposta seja aprovada em uma gestão do PT, que perdeu o controle do Congresso. Antes de assumir o poder, Fernando Henrique Cardoso prometeu acabar com a Era Vargas. Mexeu na Previdência, mas manteve as regras da CLT. As leis trabalhistas do velho Getúlio começam a ruir agora, em pleno governo Dilma Rousseff.
Fonte: Folha de S.Paulo, 9 de abril de 2015