Jefferson Luiz Maleski
Entenda as diferenças entre deficiência, incapacidade, invalidez e doença no direito previdenciário e saiba como esses conceitos influenciam o acesso a benefícios como aposentadoria e BPC.

No direito previdenciário brasileiro, os conceitos de doença, incapacidade, invalidez e deficiência são fundamentais para determinar a concessão e a gestão de benefícios e direitos para os segurados e seus dependentes. Cada um desses termos possui definições específicas e implicações distintas, conforme a legislação e a jurisprudência, influenciando o acesso a benefícios, como aposentadorias, auxílio-reclusão e pensão por morte, como também a exclusões de carência e a isenções fiscais. Este artigo explora essas diferenças com base nas leis 8.212 e 8.213 de 1991, no decreto 3.048 de 1999, na instrução normativa INSS/PRES 128 de 2022 e na EC 103 de 2019, com citações diretas de artigos das leis mencionadas.

1.Conceito de doença

A doença, no contexto previdenciário, refere-se a uma condição médica diagnosticada que não necessariamente resulta em incapacidade laboral ou invalidez. Assim, somente a doença, por si só, não dá direito a nenhum benefício previdenciário. É preciso que a doença resulte em uma incapacidade laboral. As doenças recebem códigos diferentes em uma CID Classificação Internacional de Doenças (art. 21-A, da lei 8.213/91).

1.1 Doenças comuns e doenças do trabalho

No direito previdenciário, é importante distinguir entre doença comum e doença do trabalho, pois essa diferenciação impacta diretamente os direitos e benefícios do segurado.

A doença comum é uma condição de saúde que o segurado adquire ou desenvolve independentemente de suas atividades laborais (art. 20, § 1º, da lei 8.213/91). Exemplos incluem doenças como gripe, hipertensão e diabetes, bem como doenças relacionadas com a idade, como reumatismo e Parkinson. Nesse caso, o segurado tem direito a benefícios previdenciários padrão, como o auxílio-doença, após cumprir a carência mínima de 12 contribuições mensais (art. 25, inciso I, da lei 8.213/91).

Por sua vez, a doença do trabalho, por outro lado, é uma condição de saúde diretamente relacionada às atividades profissionais exercidas pelo segurado. De acordo com o art. 20, inciso II, da lei 8.213/91, a doença do trabalho é definida como aquela que "é desencadeada pelas condições de trabalho", diferenciando-se dos acidentes típicos, mas com os mesmos efeitos legais. Assim, uma doença ocupacional gera os mesmos efeitos que um acidente do trabalho. Exemplos de doenças do trabalho incluem:

LER - Lesões por Esforço Repetitivo, associadas ao uso repetitivo de partes do corpo em atividades laborais.
Doenças respiratórias, causadas pela exposição prolongada a substâncias tóxicas no ambiente de trabalho.
A legislação previdenciária oferece algumas vantagens específicas para os segurados que contraem doenças do trabalho, desde que o incapacitem para o trabalho, reconhecendo o impacto das condições laborais na saúde do trabalhador. Dentre as vantagens, destacam-se:

Isenção de carência para benefícios: Em casos de doença do trabalho, o segurado está dispensado do período de carência para a concessão de benefícios, como o auxílio-doença acidentário e a aposentadoria por invalidez acidentária. Essa isenção está prevista no art. 26, inciso II, da lei 8.213/91, beneficiando o trabalhador desde o início da incapacidade.

Estabilidade no emprego: Ao retornar ao trabalho após receber auxílio-doença acidentário devido a uma doença do trabalho, o segurado tem direito à estabilidade de 12 meses em seu emprego, conforme art. 118 da lei 8.213/91. Essa estabilidade impede a dispensa sem justa causa nesse período, proporcionando segurança ao trabalhador.

Depósito do FGTS: Durante o período em que o trabalhador ficar afastado do trabalho por causa de doença do trabalho, o empregador também deverá efetuar normalmente os depósitos do FGTS na conta vinculada ao trabalhador.

Essas vantagens são garantidas para reconhecer os riscos aos quais os trabalhadores estão expostos em suas atividades, reforçando a proteção previdenciária para aqueles que enfrentam condições adversas e oferecendo um amparo financeiro mais robusto em caso de doença do trabalho.

1.2 Dispensa da carência

1.2.1 Para doenças graves

A legislação estabelece que segurados acometidos por doenças graves listadas pelo Ministério da Saúde estão dispensados da carência para concessão de benefícios como o auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez. Essas doenças graves, incluem as neoplasias malignas, AIDS e doenças cardíacas graves, estão listadas no art. 151 da lei 8.213/91.

Art. 151. Até que seja elaborada a lista de doenças mencionada no inciso II do art. 26, independe de carência a concessão de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez ao segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido das seguintes doenças: tuberculose ativa, hanseníase, alienação mental, esclerose múltipla, hepatopatia grave, neoplasia maligna, cegueira, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante), síndrome da deficiência imunológica adquirida (aids) ou contaminação por radiação, com base em conclusão da medicina especializada.

1.2.2 Para doenças ocupacionais

Em casos de doença ocupacionais, que incluem as doenças profissionais (relacionadas à atividade laboral) e as doenças do trabalho (relacionadas ao ambiente de trabalho), o segurado está dispensado do período de carência para a concessão de benefícios, como o auxílio-doença acidentário e a aposentadoria por invalidez acidentária. Essa isenção está prevista no art. 26, inciso II, da lei 8.213/91, beneficiando o trabalhador desde o início da incapacidade.

2.Conceito de incapacidade

A incapacidade é a perda parcial ou total da capacidade laboral do segurado, avaliada em relação à sua atividade profissional. Segundo o art. 59 da lei 8.213/91, a incapacidade pode ser temporária, resultando no direito ao auxílio-doença, ou permanente, possibilitando a aposentadoria por invalidez (art. 42).

2.1 Tipos de incapacidade

A incapacidade pode ser parcial, ou seja, atinge apenas uma das atividades laborais do segurado, ou pode ser total, quando atinge todas as em atividades laborais que o segurado atua.

Haverá incapacidade temporária quando o segurado, por motivo de saúde, fica temporariamente impedido de trabalhar, podendo ter direito ao auxílio-doença, conforme o art. 59 da lei 8.213/91. A incapacidade temporária pode ser parcial, gerando direito ao auxílio-doença somente relacionado à atividade que o segurado está incapacitado, mas não para as outras.

Nesse sentido, em tese, o segurado poderia receber auxílio-doença referente à atividade em que se afastou por incapacidade ao mesmo tempo que recebe o salário referente à atividade que não está incapacitado. Um exemplo seria uma pessoa que durante o dia trabalha como professor e a noite é baterista em uma banda. Caso tivesse um problema de voz, provavelmente se afastaria apenas da atividade de professor.

Por sua vez, haverá incapacidade permanente quando o segurado não tem possibilidade de recuperação. Contudo, enquanto a incapacidade permanente e parcial pode dar direito ao recebimento do auxílio-acidente (art. 86 da lei 8.213/91), a incapacidade permanente e total pode dar direito ao recebimento de aposentadoria por invalidez (art. 42 da lei 8.213/91).

INCAPACIDADE DEFINIÇÃO CARACTERÍSTICAS BENEFÍCIOS

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3.Conceito de Invalidez

Pode-se dizer que a invalidez é um estágio um nome próprio para quem possui incapacidade total e permanente, sendo irreversível o seu retorno para o trabalho.

Segundo o art. 42 da lei 8.213/91, a aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, por motivo de doença ou acidente, esteja incapaz de exercer qualquer atividade laboral.

Contudo, além da aposentadoria por invalidez prevista para os segurados da Previdência Social, os dependentes que tenham invalidez também possuem algumas regras diferenciadas para receberem auxílio-reclusão e/ou pensão por morte. Filhos e irmãos solteiros maiores de 21 anos que tenham invalidez anterior à prisão ou ao falecimento do segurado, não perdem a qualidade de dependente e podem pedir estes benefícios (art. 16, I, da lei 8.213/91). A cessação da invalidez é motivo para a cessação destes benefícios (art. 77, § 2º, III e V, a, da lei 8.213/91).

4.Conceito de deficiência

A deficiência é definida no direito previdenciário pela lei Brasileira de Inclusão (lei 13.146/15), que caracteriza como pessoa com deficiência aquela que apresenta um impedimento de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, que limita sua participação plena e efetiva na sociedade em condições de igualdade com as demais pessoas.

4.1 Aposentadorias com idade ou tempo de contribuição reduzidos

A lei 8.213/91, em seu art. 3º, estabelece que o segurado pessoa com deficiência tem direito à duas aposentadorias com critérios diferenciados. Uma delas é a aposentadoria por idade para a pessoa com deficiência, concedida 5 anos antes, ou seja, aos 60 anos de idade para homens com deficiência e aos 57 anos de idade para mulheres com deficiência.

Por sua vez, a aposentadoria por tempo de contribuição para a pessoa com deficiência não observa o gênero, mas o grau da deficiência (leve, moderada ou grave). Assim, homens com deficiência se aposentarão com 33 anos de contribuição se a deficiência for leve, com 29 anos de contribuição se a for moderada ou com 25 anos de contribuição se for grave. Da mesma forma, mulheres com deficiência se aposentarão com 28 anos de contribuição se a deficiência for leve, com 24 anos de contribuição se for moderada ou com 20 anos de contribuição se for grave (art. 70-D do decreto 3.048/99).

4.2 Benefício assistencial (BPC LOAS)

O BPC - Benefício de Prestação Continuada, previsto na LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social, é um direito assegurado às pessoas com deficiência que se encontram em situação de vulnerabilidade social. De acordo com a lei 8.742/93 (LOAS) e regulamentado pelo art. 20, a pessoa com deficiência, para ter acesso ao BPC, deve comprovar impedimento de longo prazo - seja de natureza física, mental, intelectual ou sensorial - que a impossibilite de participar plenamente da sociedade em condições de igualdade.

Além disso, o benefício é destinado a pessoas com deficiência cuja renda familiar per capita seja inferior a um quarto do salário mínimo, caracterizando a situação de vulnerabilidade econômica. O BPC consiste no pagamento mensal de um salário mínimo, e, diferentemente da aposentadoria, não requer contribuições prévias ao sistema previdenciário, sendo um amparo fundamental que visa promover a dignidade e inclusão social dessas pessoas.

5.Diferenças Práticas e Aplicação dos Conceitos

Cada um dos conceitos mencionados - doença, incapacidade, invalidez e deficiência - possui finalidades e critérios próprios no direito previdenciário. Vejamos:

CONCEITO DEFINIÇÃO CRITÉRIOS E APLICAÇÕES

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6. Exclusão da carência e isenção de imposto de renda

O art. 26 da lei 8.213/91 estabelece que a carência, ou período mínimo de contribuição, pode ser dispensada em casos de doenças graves. A EC 103/2019 mantém a proteção para segurados em situações de vulnerabilidade, como no caso de doenças graves e incapacitantes, prevendo a exclusão da carência para concessão de benefícios nesses casos.

Além disso, a legislação tributária brasileira prevê isenção de Imposto de Renda para aposentados por invalidez ou pensionistas com doenças graves (art. 6º, XIV da lei 7.713/88)

7. Considerações finais

As diferenças entre doença, incapacidade, invalidez e deficiência no direito previdenciário brasileiro impactam diretamente na concessão e gestão dos benefícios. Compreender essas distinções, conforme disposto nas leis 8.212 e 8.213/91, decreto 3.048/99, IN INSS/PRES 128/2022 e EC 103/2019, é fundamental para garantir os direitos dos segurados e dependentes. Essas previsões refletem a função de proteção social da previdência e da assistência social, assegurando que cada segurado ou dependente tenha o suporte necessário de acordo com suas condições


Jefferson Luiz Maleski
Advogado previdenciarista. Palestrante pela Escola Superior de Advocacia (ESA-GO). Professor universitário. Juiz do Tribunal de Ética e Disciplina (TED-GO). Perito judicial. Mora em Anápolis.

MIGALHAS

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